A Escrita Terapêutica como Terapia de Exposição

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A Escrita Terapêutica como Terapia de Exposição

Quando você ouve falar em Escrita Terapêutica, o que te vem à mente?

Belas palavras? Poesia? Sentimentalismo?

Talvez essa seja a sua visão da Escrita Terapêutica. E entendo o porquê de você acreditar que escrever, no contexto da saúde mental e do desenvolvimento pessoal, resume-se a isto.

Ainda há muitos mitos circundando a Escrita Terapêutica e, embora as pesquisas sejam suficientes para já estabelecermos uma forma mais sofisticada de entendê-la e aplicá-la, acredito que a técnica ainda seja subestimada e subutilizada.

A Escrita Terapêutica é uma poderosa ferramenta para abordagem e tratamento da saúde mental, e  homens e mulheres, jovens e idosos, de todas as classes sociais, podem se beneficiar da técnica.

Neste artigo, você irá entender o que é a Escrita Terapêutica por outro ângulo: como uma técnica de Terapia de Exposição. 

Espero, assim, fornecer uma visão mais fundamentada e menos enviesada da Escrita Terapêutica.

A Terapia de Exposição é o carro-chefe dos tratamentos, principalmente, de ansiedade e de Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Mas é também altamente eficiente para casos de depressão.

Entenda, agora, como a Escrita Terapêutica funciona como uma exposição sistemática altamente eficiente.

Vamos direto ao assunto!

O QUE É A TERAPIA DE EXPOSIÇÃO?

A Terapia de Exposição é uma das abordagens terapêuticas mais eficientes disponíveis no arcabouço do trabalhador em psicologia clínica.

Às vezes ignorada, às vezes propositalmente deixada de fora das discussões sobre tratamentos em saúde mental, a terapia de exposição é amplamente utilizada, até por aqueles que fingem não conhecê-la ou recusam suas bases teórico-conceituais.

Entende-se que todo tipo de terapia que tem como base o aprendizado é uma terapia de exposição.

Usada com frequência para tratar desordens do medo (ansiedade), a terapia de exposição consiste em

Colocar o paciente, por sua própria vontade, num “cenário” em que ele irá enfrentar seus medos, pouco a pouco, até que se torne mais tolerante ao objeto temido (em outras palavras, até que se torne mais corajoso.

Exemplo prático

Imagine que você desenvolveu, em certo ponto da vida, medo intenso e aversão às aranhas.

E, infelizmente, embora nem todas sejam perigosas, seu medo se aplica a todas elas, sem distinção, e sua reação a ver uma aranha (mesmo que de longe), e talvez, até, a meramente pensar numa aranha, é absolutamente desproporcional ao perigo real que o bicho representa.

Lembram-se do artigo sobre Ansiedade? Então! É essa reação desproporcional que define o diagnóstico da fobia, e é essa reação desproporcional o foco da terapia de exposição.

Portanto, até as pequenas aranhas que costuram discretas redes em cima do lustre da sua sala ou atrás do armário da cozinha te causam um pavor insuportável.

Como trataríamos o seu problema com Terapia de Exposição?

1. Você precisa entender que é um problema e que é possível tratá-lo: no caso de fobias específicas como a aracnofobia, fica claro que é um problema.

É óbvio que a reação é exagerada, é óbvio que responder tão mal assim a um animal tão presente no nosso cotidiano irá te colocar em situações constrangedoras, irá te impedir de sair de casa, talvez de trabalhar, e assim por diante.

Assim, assumindo o seu problema, é importante que você saiba que muitas pessoas já sofreram de fobias e foram curadas ou, ao menos, melhoraram grandemente sua qualidade de vida depois de um bom tratamento.

2. Você decide enfrentar o seu medo: o próximo passo da terapia é tomar essa decisão. É dizer: “OK. Eu tenho esse medo absurdo, é desproporcional, está me atrapalhando. Para curá-lo, preciso enfrentá-lo. Certo. Vamos a isso, então.”

Dentro de um setting terapêutico, o psicoterapeuta, psicólogo clínico, psiquiatra, irá te ajudar a tomar essa decisão, também, ao te explicar que você não precisará, amanhã, tocar numa aranha e ficar de boa.

Não, mesmo! O terapeuta irá te ajudar a planejar uma série de exercícios para que você se aproxime de pouco em pouco ao seu objeto de temor, com o auxílio dele.

3. Decidir e colocar em prática o primeiro passo: você e seu terapeuta irão conversar e estabelecer o primeiro exercício de enfrentamento. Talvez você queira tentar ver uma fotografia de uma aranha a 4 metros de distância.

Perfeito! Será a fotografia, então. O terapeuta irá te instruir a olhar para a fotografia, já colocada a 4 metros de distância, pelo tempo que você der conta. Talvez você olhe 3 segundos e tenha que virar o rosto. O terapeuta irá propor um exercício de respiração (para acalmar os nervos), te encorajar a olhar, pelo menos, mais uma vez, e assim por diante.

Você irá tão longe quanto pode em cada exercício.

4. Seguir o tratamento: depois, você irá colocar essa fotografia cada vez mais próxima a você. Talvez, no 5º dia de tratamento, você já seja capaz de pegar a fotografia na mão e olhar para ela, com certo nível de estresse, mas absolutamente sob controle.

Depois, talvez você seja até capaz de pegar um pote no qual uma aranha viva tenta, inutilmente, traçar uma rota de fuga.

E então, você se torna capaz de ver uma pequena aranha passando daqui para ali, de vez em quando, e ignorá-la, ou espantá-la, ou matá-la, sem grandes problemas.

Sucesso!

Você aprendeu:

  • a se acalmar ao sentir os sintomas terríveis do pavor;
  • a forçar a sua atenção a um estímulo aversivo;
  • a ser mais corajoso;
  • que você é capaz de enfrentar não só este, mas todos os seus objetos de temor.

Vira e mexe, Jordan Peterson delineia o tratamento de Terapia de Exposição para seus interlocutores e comenta: quando alguém passa por uma Terapia de Exposição de sucesso, acontece algo muito interessante durante o processo.

No meio do processo, a pessoa volta ao consultório do psicólogo contando que teve uma briga feia com o marido ou esposa… Uma daquelas brigas que eles já deveriam ter tido há anos!

Ou que conseguiu pedir um aumento ao chefe, ou se impor contra um “bully(pessoa que pratica o bullying) qualquer no ambiente de trabalho.

Professor Peterson, que acumulou mais de 20 mil horas de atendimentos clínicos, confirma que isso é muito, muito comum.

E, se pensarmos bem, faz todo sentido: eu enfrento um medo. Enfrento, de verdade. Eu triunfo sobre o meu temor. Me torno mais corajosa, mais corajoso. Ora, acho que eu consigo, sim, falar o que eu penso, me impor, sem me abalar tanto.

E é assim que a Terapia de Exposição ativa uma série de circuitos neurológicos voltados a novas aprendizagens, fortalece a vontade de uma pessoa, fortalece seu senso de eu, e cura-a de diversos medos simultaneamente.

O paciente adquire uma nova série de repertórios comportamentais (sequências de atos que se mantém), mais ricos e mais “em conformidade” com aquilo que ele mesmo espera ou deseja do seu próprio comportamento.

Mas, e aí? O que a Escrita Terapêutica tem a ver com tudo isso?

É bem simples: a Escrita Terapêutica pode ser uma técnica de exposição também!

Escrita Terapêutica como Terapia de Exposição

A Terapia de Exposição é altamente eficiente para tratar ansiedades, fobias, medos. 

Podemos concordar que ansiedades, fobias e medos, embora tenham iniciado em algum ponto da vida da pessoa, são desordens presentes, certo? Se apresentam no cotidiano da pessoa, toda vez que ela encontra o estímulo aversivo.

Mas, e quando o sofrimento de alguém ocorreu no passado?

A ansiedade é uma resposta a um objeto temido no momento presente: você acredita que aranhas sejam horríveis, perigosas, nojentas e, toda vez que vê uma aranha, responde, reage, como se o bicho fosse uma ameaça de morte. Certo!

Mas a ansiedade também pode ser uma resposta a um trauma vivido, sobre o qual não se produziu entendimento, compreensão e repertórios comportamentais saudáveis.

Alguém que sofreu bullying na infância, por exemplo, pode ter ansiedade social hoje. 

Digamos que ela não esteja sofrendo bullying atualmente. Verdadeiramente, essa pessoa em sofrimento está respondendo às situações sociais atuais com um modelo de enfrentamento antigo, desatualizado.

O que está acontecendo?

*Henrique tinha 7 anos quando mudou de escola e começou a ser perseguido por colegas.

Esses bullies eram de uma série acima de Henrique e costumavam colocar todos os alunos novos nessa prova de fogo perversa.

Henrique, introvertido, sem amigos, filho único e enfrentando o divórcio dos pais, acabou guardando esse sofrimento para si.

Não contou para as professoras (que também não repararam ou decidiram não intervir na situação), não contou para a mãe ou para o pai. Sofreu durante 1 ano e meio com essa perseguição: levava, às vezes, tapas e empurrões, mas, no geral, o objetivo da perseguição era apenas isolá-lo e fazê-lo se sentir permanentemente ameaçado.

A história só acabou quando um novo aluno chegou, e os bullies desistiram de Henrique e passaram para sua próxima vítima.

Os anos se passaram e Henrique conseguiu fazer alguns amigos, seguiu relativamente bem na sua vida acadêmica e teve algum sucesso em ter relacionamentos românticos.

Entretanto, até hoje, com 23 anos, mudar-se, conseguir um novo emprego, ir a festas, praticar esportes, são movimentos e atividades que ele evita a todo custo. Qualquer lugar com gente estranha e diferente ativa nele uma resposta ansiosa grave.

Não é difícil estabelecer a relação entre a sua história infantil e sua situação atual.

Henrique sofreu um tipo de perseguição (bullying) justamente quando se mudou para uma escola nova.

Ele associou esse tipo de sofrimento a qualquer situação nova.

Ele, provavelmente, associou “ser perseguido” com “ser novato”, e assim por diante.

Ele não desenvolveu, à época, um mecanismo de enfrentamento. Ninguém o ensinou como se defender, ou como pedir ajuda. Ele permaneceu desamparado nessa situação.

Hoje, com 23 anos, embora ele tenha 1,80m e seja um homem feito, nas situações sociais e em qualquer situação que seja uma novidade, ele ainda se sente desamparado, da mesma forma, como se ele fosse incapaz de lidar com essas situações.

Pois bem! Como faríamos uma Terapia de Exposição, nesse caso? E como a Escrita Terapêutica pode ajudar? 

  • *História fictícia.

Terapia de Exposição para Eventos Traumáticos: Escrita Terapêutica

Podemos expor Henrique, in vivo, voluntariamente (é claro), a situações sociais de menor e maior magnitude, e treinar sua reação fisiológica a esses eventos, e ensiná-lo a ser mais corajoso.

Provavelmente seria muito efetivo.

Mas também, e talvez de forma ainda mais efetiva, podemos expor Henrique à sua situação-chave do passado, que o fez desenvolver essa ansiedade social e essa resistência a mudanças.

Como? Pela Escrita Terapêutica.

Talvez Henrique ainda se sinta muito envergonhado daquela cena específica, talvez ainda se sinta ressentido daquelas professoras, daquelas pessoas, naquela situação.

Ele evita pensar nisso a todo custo, detesta quando essas imagens lhe ocorrem, mas, elas insistem e retornam, e ele se sente mal, desamparado e incompetente como ser humano.

Podemos expor Henrique a essa situação traumática pela memória e imaginativamente , e utilizando da escrita como recurso técnico.

Quais são os resultados?  

Recentes pesquisas têm apontado que a Terapia de Exposição Narrativa têm a mesma eficácia da Terapia de Exposição “tradicional” para Transtorno de Estresse Pós-Traumático, por exemplo.

Na verdade, a meu ver, os dois modos têm a mesma eficácia porque são, praticamente, a mesma coisa. É Terapia de Exposição, de qualquer maneira.

Outras aplicações da Escrita Terapêutica como Terapia de Exposição

A Terapia de Exposição pode ser aplicada a tudo aquilo de que temos medo, certo? Foi no tratamento das desordens associadas ao medo que se descobriu a eficácia da técnica.

Agora, vamos expandir a definição de “objeto aversivo” ou “objeto de temor”.

Já entendemos que diversos objetos podem causar reações de ansiedade patológicas: aranhas, cobras, elevadores, “altura”.

Situações também podem causar reações de ansiedade patológicas: situações sociais, situações de intimidade física e românticas, situações de testagem (provas e exames), perder-se num local desconhecido, etc.

Também temos medo do que pode acontecer! Temos medo do passado, do presente e do futuro. Somos criaturas absolutamente apavoradas!

Podemos nos expor, pela escrita, a medos do passado (uma cena que você não gosta de rever, uma situação que causou dor emocional), ao presente, elaborando uma situação ou medo presente, e também podemos nos expor ao futuro.

Podemos nos expor ao futuro porque podemos imaginá-lo.

Vou deixar para que você mesmo continue esse raciocínio e chegue à compreensão da aplicabilidade da técnica da Escrita Terapêutica ao planejamento do futuro, e enfrentamento do que há por vir.

Conclusão

Espero que a extensão do texto não tenha atrapalhado a sua experiência.

Neste artigo, entendemos o que é a Terapia de Exposição, sua aplicabilidade e os resultados esperados dessa abordagem, e vimos alguns exemplos.

Depois, tentei estabelecer uma ligação entre a Terapia de Exposição e a Escrita Terapêutica, e sigo afirmando que a Escrita Terapêutica é uma forma de exposição, aliás, mais barata, e menos custosa.

Vamos voltar diversas vezes a esse tema.

Acredito muito no poder da escrita para melhorar a saúde mental, a vida presente e o futuro das pessoas.

Por enquanto, fiquem com essas informações e, caso tenham interesse, conheçam o meu e-book “7 Exercícios de Escrita para a Cura e o Autodesenvolvimento”, inspirado pelas melhores pesquisas e programas disponíveis de Escrita Terapêutica.

Acesse também as minhas Referências e leia mais sobre Escrita Terapêutica e Terapia de Exposição!

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