Escrita terapêutica: o que escrever quando não se sabe o que escrever

Escrita terapêutica: o que escrever quando não se sabe o que escrever

Escrever é difícil. Alguns afirmam que é a coisa mais difícil do mundo. Será por isso que a Escrita Terapêutica é tão efetiva?

Montar e estabilizar frases, primeiro na nossa cabeça, e então vê-las marcadas no papel, conferir se o sentido desejado foi marchetado com sucesso à folha; estranhar o resultado.

Perguntar-se: o que era mesmo que eu queria dizer? Perder-se na sequência de ideias, não saber montar uma cena, não achar as palavras certas para os sentimentos e para as experiências do sentido.

Quando escrevemos, podemos diagnosticar com certo nível de confiabilidade, o estado da nossa organização mental, a capacidade da nossa atenção, e a força da nossa vontade.

Jules Payot afirma, em “O Aprendizado da Arte de Escrever” (1913):

“Enquanto o homem não pensa por si próprio, enquanto seus atos mais importantes não expressam os fundamentos de sua personalidade, ele segue à deriva, desamparado e sacudido para todos os lados pelo vagalhão de impressões desordenadas que arrebenta contra o limiar da consciência.

Educar é libertar, isto é, dar força à personalidade da criança para resistir ao perigo da deriva mental. Para que o esquife resista às ondas, é preciso que seja equilibrado por sua quilha e dotado de um bom leme. Da mesma forma, para que o espírito resista às correntezas, é preciso que seus impulsos estejam em equilíbrio, e que a razão maneje o timão.

Para obrigar a criança a enxergar com clareza através de suas inclinações, suas disposições e virtualidades naturais, suas aptidões e ‘preformações’ e para organizar essa massa confusa de forças de acordo com a razão, não há exercício que se compare à composição francesa*. (…)

* ou seja, à escrita, à redação.

É isto!

Escrever é um exercício do pensamento, de organização das relações entre este e as emoções, de afinamento das cognições, de visualização, raciocínio e imaginação.

Jordan Peterson afirma: “escrever é pensar de maneira formal”.

Costumo conceituar a Escrita Terapêutica como um conjunto de técnicas em que se usa a escrita para melhorar a qualidade de vida e a saúde física e mental das pessoas.

Para esse fim específico, pesquisadores, psicólogos clínicos e terapeutas desenvolveram exercícios específicos (como os que você vai encontrar nos “7 Exercícios de Escrita para a Cura e o Autodesenvolvimento“), mas a escrita pode ser aplicada para um leque de possibilidades.

Por exemplo:

  • se você vai a uma entrevista de emprego, você pode escrever para treinar seus argumentos, sua expressão oral, para fortalecer sua confiança.
  • se você precisa tomar uma decisão importante, como mudar-se de cidade, aceitar o emprego novo que conseguiu, dar fim a um relacionamento, etc., pode utilizar a escrita para definir os pontos positivos  e negativos de cada escolha, para criar uma visão sobre a nova vida que irá construir, e assim por diante.
  • se você teve uma ideia de negócio, ou de um novo projeto para implementar no seu trabalho, pode escrever para articulá-lo, definir cada elemento e cada ponto de atenção, etc.

Ou seja, podemos usar a escrita para cuidar da nossa vida, em vários aspectos e sentidos.

Neste artigo, vou dar um empurrãozinho para aqueles que acreditam no poder da escrita terapêutica, querem escrever, mas não dão conta de começar, por algum motivo.

Siga a leitura que eu já dou a solução!

Dificuldades no trabalho de Escrita Terapêutica

De cara, a Escrita Terapêutica é um desafio. Se não fosse, que cura seria possível extrair desse trabalho? Que desenvolvimento ocorre sem esforço e sem dor?

O primeiro exercício proposto nos 7 Exercícios de Escrita para a Cura e o Autodesenvolvimento é um dos mais difíceis.

É exatamente a mesma instrução utilizada nas primeiras pesquisas de James Pennebaker, que ele descreve detalhadamente no livro: Expressive Writing – Words That Heal.

A instrução é: escreva sobre um trauma que você viveu. Depois, expresse como essa experiência mudou a sua vida, a sua personalidade, e a forma que você enxerga o mundo.

A que tipo de coisas estamos nos referindo quando falamos sobre traumas?

  • a morte de alguém próximo (amigo, familiar);
  • ferimentos ou adoecimento grave;
  • traições de todos os tipos;
  • experienciar cenas de violência extrema (como em situações de guerra);
  • violência física ou sexual.

Vale, da mesma maneira, para os propósitos desse exercício, falar sobre ocorrências “menores”, mas que causaram um sofrimento agudo. 

Ter sofrido algum tipo de negligência, abandono, ter sido sistematicamente exposto a tratamentos humilhantes, sofrer assédio moral ou sexual; todas essas são experiências que, embora em algumas definições não podem ser entendidas como traumáticas, causam rupturas e desequilíbrio na psique.

Estas experiências também podem ser abordadas por meio da Escrita Terapêutica.

Assim, de qualquer maneira, esse exercício irá pedir que você faça um esforço considerável de olhar onde você não quer ver; a lembrar do que você gostaria que nem tivesse acontecido; a enfrentar um mal cuja natureza você desconhece.

É um grande esforço! Mas é justamente esse esforço, o de narrar, de olhar, de enfrentar, que irá te tornar maior do que o trauma que ainda te assombra.

Muitas vezes, entretanto, na hora de sentar para efetivamente fazer, sua mente realmente trava.

Parece que nada irá sair no papel. Você não tem ideia de por onde começar.

Aqui vão, então, algumas dicas para quando você estiver nesse estado. Quando as palavras resistem ao traço, quando a folha resiste às imagens que seu corpo e sua mente não querem voltar a ver.

O que escrever quando não sei o que escrever?

Escreva o que te ocorre

Quando não souber, ou não conseguir escrever, sente-se no seu local de trabalho e escreva exatamente o que te ocorre à mente. Assim:

  • “Não consigo começar a escrever. Comprei esse e-book e achei que fosse capaz, mas vejo que tenho preguiça, resistência, inibição para começar. Minha letra é tão feia…”
  • “Por que é que não consigo começar? Sei que preciso escrever sobre essa situação mas, agora, que estou com caneta e papel em mãos, sinto que não quero mais.”
  • “Só de pensar em escrever meu coração acelera, meu estômago revira; neste momento gostaria de estar fazendo qualquer outra coisa. Até lavar a louça seria um escape satisfatório.”

Exatamente assim!

Você pode se sentar e simplesmente descrever o que passa pela sua cabeça, lamentar o seu estado físico, observar suas emoções e colocá-las no papel.

Esse esforço irá criar em você, é claro, o hábito de escrever, mas também começa a construir a intimidade que você precisa com o ato.

Escrita Terapêutica: comece com tópicos

Use tópicos quando você sente que não consegue escrever de forma corrida.

Você pode resumir ao máximo a sua escrita utilizando tópicos.

Em outro exercício dos 7 Exercícios de Escrita para a Cura e o Autodesenvolvimento, proponho, por exemplo, que você se olhe de fora, e tente inferir algumas informações sobre o seu comportamento.

Uma dessas perguntas é “O que essa pessoa quer da vida?”. Ou seja, observando o seu comportamento externo, como se você fosse uma pessoa estranha a si mesmo, tente inferir, pelas suas ações, o que você quer da vida.

Você pode responder a essa pergunta com:

“Essa pessoa quer se realizar profissionalmente, deseja ter experiências culturais interessantes em viagens…”

Mas, se você ainda não tem fluência verbal o suficiente para se expressar assim, coloque apenas:

  • profissional
  • viagens
  • curso de fotografia

Mais tarde, você pode voltar a esses pequenos tópicos e, aos poucos, tentar elaborá-los mais profundamente. É muito importante elaborá-los profundamente! Quando mais você elabora e detalha um assunto, na Escrita Terapêutica, mais efetiva ela se torna.

“A leitura é a base da arte de escrever”

Quem disse foi Antoine Albalat em “A Arte de Escrever ensinada em 20 Lições”.

Aprender, por exemplo, a nomear os sentimentos, é uma das funções mais importantes da Escrita Terapêutica.

Da mesma maneira, você deve saber unir, em narrativa, memórias emocionais a memórias materiais e contextuais, elaborar uma cena, elaborar ideias, elaborar um plano de ação.

A fonte mais rica dessa arte é, evidentemente, a Grande Literatura.

Leia as grandes obras e encontre as melhores palavras para traduzir o seu mundo interior!

Conclusão

Não desista de você mesmo por pequenos impedimentos na tentativa de escrever.

Toda vez que tentamos uma coisa nova, somos iniciantes, sabemos pouco, iremos errar muito. O processo é, justamente, reconhecer as incapacidades e trabalhar, treinar, até que elas sejam superadas.

Esse raciocínio pode ser aplicado a vários níveis: ao nível mesmo da escrita, do ato físico de escrever; depois, ao nível da elaboração de ideias, do enfrentamento das emoções, da criação de uma narrativa, e assim por diante.

Portanto, a Escrita Terapêutica sempre exigirá de você um esforço e, por isso mesmo, as recompensas são enormes!

Leia os outros artigos para saber mais sobre a Escrita Terapêutica, e comece a sua jornada de cura e autodesenvolvimento!

category:

Blog

Tags:

No responses yet

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *